sexta-feira, 6 de maio de 2011

Menos Trovões, Por Favor

Thor é a mais recente adaptação de um personagem de Histórias em Quadrinhos para o Cinema, mais especificamente a adaptação de um super-herói da editora Marvel Comics. Nos últimos anos criou-se um subgênero dentro dos filmes de Aventura e de Fantasia graças aos esforços conjuntos das antigas editoras de HQ's para transplantar seus antigos produtos para outras linguagens, como desenhos animados e filmes para Cinema, grande parte do sucesso se deve à fusão destas editoras com as Majors do audiovisual. A parte que cabe à Marvel Studios foram filmes feitos pela Paramount e pela FOX após sua aquisição pelo grupo Disney.

O motivo para iniciar a análise com estas características é explicar que o filme, como produto, é um resultado entre muitos de um esforço conjunto de reerguer a indústria das HQ's que estava indo à falência nos anos 90. Isso fez com que determinadas editoras transpusessem sua linguagem já consagrada em bandas desenhadas e criassem um código próprio, formatado dentro do Cinema Clássico norte-americano, porém com algumas atualizações e subversões. O grande problema deste código é que ele tornou-se repetitivo, engessando novas produções e tornando muito similares personagens outrora completamente diferentes entre si: o subgênero nasceu pobre e ainda não conseguiu ir muito além disso.

A diferença entre os personagens nas HQ's se dava especialmente por suas diversas origens. Quando cito origem de personagem eu falo da criação, conceito e contexto histórico em que foram criados, já que a linguagem se tornou uma das primeiras mídias a adotar produtos diferentes para diferentes perfis de público e de idade, se preocupando com adultos, adolescentes e crianças. Com a mercantilização mais voraz houve uma compra em massa de personagens de editoras menores por editoras maiores, que criaram um verdadeiro leque e diversos selos diferentes para comportar toda a gama diferenciada de histórias. Com o passar do tempo a falta de visão das grandes editoras (especialmente a Marvel e a DC) tornou os produtos enfadonhos e repetitivos e viu-se uma queda gigante no consumo de seus produtos, que não conseguiam competir com outras mídias de entretenimento.

Como em qualquer meio existem grupos independentes ou alternativos que tentam inovar e mudar a linguagem, porém o avanço da linguagem da HQ se deu muito mais em direção ao aproveitamento de espaço na página e até das próprias características físicas da página de papel, como tamanho, gramatura, transparência, etc, do que em uma ruptura narrativa do que já estava sendo feito nos quadrinhos e na literatura de anos anteriores. A grande questão que assombra “Thor” é que vemos a adaptação dessa linguagem pobre e conhecida para as telas, o pior momento da linguagem dos quadrinhos, que é a de formatar histórias antes mais complexas e tornar qualquer personagem insípido e parecido com tantos outros.

O filme possui um formato de narrativa dramática clássica e apresenta o personagem logo no início do filme, através de um flashback que nos tira do planeta terra e nos leva à terra-natal do personagem, um lugar lendário chamado Asgard. A representação de Asgard como um lugar de mito e imaginação não convence o espectador atual, ela abusa de efeitos especiais que realmente se parecem com efeitos especiais, ou seja, é quase impossível fecharmos um acordo de credibilidade com o filme quando vemos seres humanos interagindo com ambientes claramente desenhados em computador. A antiga terra das lendas nórdicas que inspirou tantos povos e gerou tantas canções e mitos parece ser feita de pixels, e não de sonhos.

Outra questão importante é que o figurino e os objetos de cena nos lembram que estamos vendo atores fantasiados. É tenebrosa a visão de um ator fantasiado lutando contra criaturas criadas em computador em um ambiente 3D que não é crível, o que acontece muito durante os primeiros 30 minutos da obra.

Thor, o deus do trovão, se sai muito melhor quando aparece depois do flashback em nosso planeta. Ele é mais convincente com uma roupa comum, em ambientes humanos e demonstrando suas fraquezas depois de perder todos os poderes. O resultado é que o público ri, grita e interage na sala de exibição. O mesmo acontece em outros filmes que a Marvel produziu, o Homem-Aranha sem uniforme andando na rua é bem mais simpático do que quando é feito balançando em sua teia entre prédios na Manhattan 3D. Finalmente, o filme não supreende no conteúdo, mas brinca com o que se espera de um herói com muito bom humor. Se pudermos separar os tipos de heróis já estabelecidos poderíamos dizer que Thor é um Herói Heróico, ou seja, não tem nada de mundano ou anti-herói, ele é tudo o que esperamos de alguém que passou pela jornada de transformação e cresceu com isso. Porém, quando fragilizado, protagoniza cenas cômicas dignas de um pastelão, o que nos faz querer que as cenas em Asgard e de combate passem mais rápido para que a história de fundo, mais simples, avance.

Infelizmente o resultado de tudo é um entretenimento medíocre, de um subgênero que não tem variado muito e que nos oferece bolos sempre com o mesmo sabor e uma cobertura diferente. O diretor Branagh se sente muito mais à vontade em seu campo de atuação, ou seja, quando trabalha com pessoas, e isso se reflete na tela. Espero que tenha mais sorte da próxima vez.

André Natali


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